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Conheça o Maestro Miguel Philippi, compositor da música do Hino Oficial da CF 2022

Maestro Miguel Philippi

Miguel Philippi, maestro da Associação Coral Santíssima Trindade, desta paróquia, além de outros corais da cidade de Florianópolis, é o compositor da música do Hino Oficial da Campanha da Fraternidade 2022. Ele também foi convidado a dirigir toda a produção da música e do CD da Campanha deste ano.

As vozes para a gravação também são da Grande Florianópolis, com a participação da Associação Coral Santíssima Trindade, Coral Nossa Senhora da Lapa e Vozes do Mar, Coral São Francisco de Assis, e mais alguns cantores convidados do Coral Bom Jesus de Nazaré. Todos se uniram sob o nome Coral Cantos da Ilha, totalizando 73 cantores. As vozes foram captadas individualmente no auditório da Paróquia Santíssima Trindade, na capital, que gentilmente cedeu o espaço.

Agradecemos ao Maestro pelo tempo dedicado a responder as perguntas da Pastoral da Comunicação que compõem esta matéria e também o parabenizamos pela conquista e pelo trabalho desenvolvido junto à música religiosa e litúrgica.

Pascom: Inicialmente, gostaríamos de um breve histórico, de como foi o começo na música, se já havia o interesse pela música religiosa, música erudita e canto coral.

Miguel: Sempre gostei de música. Sempre foi algo presente na família. Uma das minhas avós foi organista e coordenou corais em São Bonifácio. A outra cantava Terno de Reis com seus pais. Na sua infância, cantavam em festas e nas casas na região dos Açores, Sul da Ilha, antes de mudarem-se para a Serra.

Comecei a estudar música, propriamente, lá pelos 10 anos de idade aprendendo violão na minha paróquia de origem, São Bonifácio. Aos 14 ingressei no Seminário Menor Santo Antônio, em Agudos, onde tive uma imersão musical muito completa. Sob a direção do excelente professor Frei Marcos Antônio de Andrade, estudei teoria musical, participei de coro, estudei piano. Foi onde desenvolvi grande interesse pelo canto coral e música litúrgica.

Ao final do seminário menor descobri que não seria exatamente vocacionado à vida religiosa, mas insisti na vocação musical, e ingressei no curso de Música da UDESC. Logo no início do curso, recebi a oportunidade de tornar-me o regente da Associação Coral Santíssima Trindade, na Paróquia da Trindade. Depois deste, outros convites foram chegando, Coral São Francisco de Assis em Jurerê, Coral Nossa Senhora da Lapa e Vozes do Mar no Ribeirão da Ilha.

Nesse meio tempo, procurei estar à serviço das necessidades da Arquidiocese, junto ao Setor de Música e Canto Litúrgico, auxiliando na promoção de encontros e formações; e nos últimos anos, junto da Igreja do Brasil, tendo a oportunidade de participar dos encontros anuais de compositores da CNBB.

Pascom: Todos os anos ocorre a seleção de letra e música para o Hino da Campanha da Fraternidade. Esta foi a primeira vez que você participou deste processo ou já havia enviado outras composições?

Miguel: Foi a primeira vez que enviei uma sugestão. Foi grande a surpresa ao saber que a sugestão foi acolhida!

Pascom: Sabemos que, no caso do Hino da Campanha da Fraternidade, primeiro é criada a letra e posteriormente ocorre a escolha da música, que é responsável pela parte melódica da composição. Como foi o processo de criação musical desta obra, em especial, levando em conta a originalidade, as regras exigidas, visto que a obra necessita ser acessível a um público variado?

Miguel: Ao lançar o concurso, a CNBB apresenta uma série de critérios que devem ser respeitados. E são, basicamente, estes que você falou: Que a música seja original, artística, fugindo de clichês, ao passo que também seja acessível a qualquer público. Que tenha caráter vibrante, energizador, como o ressoar de “trombetas e clarins” do salmo 47. E que tenha características da música brasileira.

Norteado por estes critérios, foi uma questão de manusear as ferramentas da teoria musical para criar uma melodia com sua harmonia: Um bom “motivo musical”, criando frases, repetidas na porção certa, com variações nos tempos certos, um refrão com um bom destaque, procurando que a música estivesse sempre interessante, a cada novo verso. E muito importante: que os acentos musicais coincidissem com os acentos do texto.

O critério mais fácil de obedecer foi aquele relacionado às características da música brasileira. O Brasil tem uma imensidão de culturas, com diversas possibilidades musicais. E tem um histórico riquíssimo de grandes compositores da música litúrgica, com registros desde o período colonial. Citando alguns próximos à nossa localidade, lembro do grande Pe. Ney Brasil, José Acácio Santana, e Pe. Weber, que é natural de Anitápolis. Imerso neste meio, seria impossível criar uma melodia que não tivesse características da música brasileira.

Pascom: Na ficha técnica do canal do Youtube das Edições CNBB, consta que arranjo, instrumentação e regência também foram realizados pelo Maestro. Você costuma criar arranjos para grupos de instrumentos e orquestras, além dos trabalhos com canto coral? Como foi a participação do Coral Cantos da Ilha nesta gravação?

Miguel: Fazendo uso dos estudos que tive em harmonia musical, tenho já há um tempo a prática de escrever arranjos para as vozes do coro. As regras de harmonia usadas para escrever arranjos para coro são basicamente as mesmas que são utilizadas para instrumentos. A principal diferença é a possibilidade ou limitação de cada voz, ou de cada instrumento. Que tipo de som cada um é capaz de fazer, e como usar essas possibilidades em um arranjo. Venho estudando arranjos instrumentais há um tempo, e decidi colocar em prática nessa música. A primeira versão que enviei já estava com o arranjo vocal pronto, e o arranjo instrumental bem adiantado.

Assim que a música foi contemplada, me foi dada a oportunidade de realizar a gravação. Convidei, então, os cantores de todos os meus coros para gravarem, reunidos sob o nome Coral Cantos da Ilha. Cada cantor dedicou-se em estudar sua parte, e captei todas as vozes individualmente, por conta da pandemia do coronavírus. Todas as vozes da música foram gravadas no auditório da paróquia Santíssima Trindade, que generosamente nos cedeu o espaço.

Pascom: O tema da Campanha da Fraternidade é Fraternidade e Educação. Lembrando do tempo do Maestro Heitor Villa-Lobos e seu envolvimento com educação, como você, também como maestro, vê a situação educacional do país e a ausência de uma disciplina que incentive a música de forma mais específica?

Miguel: A música é uma habilidade muito especial do ser humano. É um dos tipos de inteligência, podendo ser coordenado, mas distinto da inteligência linguística, ou da lógica/matemática, espacial, outras. Assim como todos deveriam poder desenvolver-se em diversas áreas, deveriam poder desenvolver sua expressão musical, tão importante na formação do ser humano. Este em si já é motivo suficiente para que a música seja inserida nas escolas, vencendo o grande mito de que apenas certas pessoas possuem um dom musical e poderão aprender. Some-se a isso o comprovado efeito da educação musical auxiliando no desenvolvimento em outras áreas do conhecimento.

Em 2008 foi sancionada a lei que obriga o ensino de música em algum momento da formação das crianças nas escolas. Infelizmente, foi vetada a parte que determinava que isso deveria ser feito por um profissional qualificado. Muitas vezes, a Música é substituída por “musiquinha” para apresentar na festinha, ou “musiquinha” para decorar conteúdos de outras matérias, mas deixa de acontecer uma boa experiência musical, em que se ofereça ao educando meios de apreciar, executar, compor, e expressar sua própria musicalidade.

Pascom: Esta é uma pergunta mais extensa e reflete a realidade que vivemos nos dias de hoje. Em relação à música religiosa, vemos uma grande variedade de estilos em paróquias, comunidades, movimentos e grupo. Até a Campanha da Fraternidade enfrenta barreiras musicais, em alguns casos. São levados em conta tanto a realidade dos músicos e da comunidade, quanto as modernidades que vêm do meio secular para o religioso e até de outras religiões. Conhecendo seu trabalho e já o parabenizando pelo mesmo, como é a sua visão de qual o limite entre o que cabe e o que não cabe, na música religiosa?

Miguel: Para responder esta pergunta, farei, de início, uma distinção. Dentro dessa amplitude que temos de música que podemos chamar sacra, vou fazer uma divisão entre música litúrgica e música religiosa.

A música litúrgica é aquela que usamos na Missa. Ela é funcional. Ela foi composta para servir um propósito específico. Ao preparar um canto de Ato Penitencial, por exemplo, o compositor deve conhecer exatamente o rito e as orientações da Igreja acerca deste momento específico, para fazer a música de acordo com esta necessidade específica. Para alguns momentos, existe grande abrangência, tanto nas possibilidades de textos, quanto para o estilo musical a ser utilizado. Por isso, se faz necessário aos compositores litúrgicos e às equipes que prestam o serviço da música litúrgica procurarem a devida formação.

A música que estou chamando religiosa, por sua vez, não tem esta finalidade. O compositor pode escrever uma canção, partindo de uma experiência religiosa, ou de uma mensagem que ele queira transmitir, um sentimento que ele queira provocar, ou até para um momento de oração, distinto da Santa Missa. Sua música vai tocar no rádio, ou as pessoas vão ouvir em suas casas, em suas orações, ou vai servir para a evangelização, catequese, etc. Essa música também deveria seguir alguns critérios mais abrangentes, ao que se refere à teologia. Algumas palavras erradas podem conter sérios erros que podem ir contra os ensinamentos transmitidos pela Igreja.

O grande problema começa quando esses dois tipos de música se confundem. E, infelizmente, temos visto isso com muita frequência nos dias de hoje. Músicas religiosas, muitas vezes com equívocos teológicos, estão indo parar nas celebrações litúrgicas, em momentos para os quais não foram concebidas. E as funções da música litúrgica acabam sendo reduzidas a ter um papel de “animar”, ou de “ser tocante”, “emocionar”, antes de servirem o objetivo de cada momento, especificamente. Isso não significa que apenas o canto gregoriano acompanhado pelo órgão terá lugar na Missa. Os critérios são muito abrangentes e diversos, mas precisam ser estudados pelos agentes da Música Litúrgica.

Pascom: Agora para terminar, com um assunto mais descontraído, existe tempo para o Maestro ouvir música sem que isto seja um trabalho? Qual é a playlist do Miguel quando está em sua casa, no carro, ou naquela confraternização em família?

Miguel: Certamente existe! Ouço e aprecio diversos estilos. Volta e meia tem algum álbum de música coral ou gravações de música litúrgica nas minhas playlists, mas no geral estou ouvindo Rock ou Metal quando estou sozinho. Hoje em dia tenho ouvido um pouco de Palavra Cantada ou trilhas da Disney com a minha pequena Cecília, e às vezes ela ouve um pouco das minhas playlists também.

Por fim, agradeço por este diálogo, por poder falar um pouco sobre essa experiência com o Hino da Campanha. Aproveito para informar aos leitores que o coro da nossa paróquia está sempre aberto para todos aqueles que queiram participar, mesmo que nunca tenham tido uma experiência com música antes. Fica o convite! Muito obrigado!

Confira abaixo o Hino Oficial da Campanha da Fraternidade 2022